Um erro justifica o outro?

* Hortênsia Nunes B de Oliveira –

Semana passada foram inúmeras as manchetes que circularam noticiando o fato de um jovem que foi puxado por uma moto pilotada por um policial militar. De acordo com o Boletim de Ocorrência, o jovem de 18 anos havia furado um bloqueio policial, batido em uma ambulância e tentado fugir portando drogas ilícitas.

Quanto à ilicitude da conduta praticada pelo indivíduo, esta, sem sombra de dúvidas, será apurada e conduzida pelos órgãos competentes, que devem agir respeitando o devido processo legal e os demais princípios constitucionais e legais. Entretanto, o ponto de análise deste texto é a conduta realizada pelo policial agente que representa o Estado.

Podemos afirmar, enxergando de um pondo de vista macro, que quem puxou o sujeito não foi um simples policial militar e, sim, o Estado. Partindo desse ponto, surgem alguns questionamentos: a conduta do Estado foi correta? Um erro justifica o outro? E a dignidade humana?

Esse tema é de extrema relevância, e amplamente discutido por diversos lados e posições ideológicas, políticas etc. Entretanto, enxergo que o ponto de partida inicial para reflexão acerca de tal conteúdo é o conhecimento – que basta ser raso – do que são os direitos humanos.

No dia 10 de dezembro (hoje), comemora-se o Dia Internacional dos Direitos Humanos, adotado pela Assembleia Geral da ONU, e esse é o ponto que devemos ter conhecimento para que possamos analisar a conduta do agente público e os direitos de QUALQUER indivíduo, independente da sua postura ou conduta.

Os direitos humanos são aqueles tidos como básicos e necessários a todas as pessoas. São direitos como à vida, à liberdade de pensamento, à liberdade de expressão, ao trabalho, à educação, à igualdade etc. A Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU afirma que “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”.
A Carta magna que vigora no país garante a preservação dos direitos humanos. Nela, temos os princípios da cidadania, da dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho, consagrados em seu primeiro dispositivo.

Temos como objetivos fundamentais: a construção de uma sociedade livre, justa e solidária; a erradicação da pobreza e da marginalização, bem como a redução das desigualdades sociais e regionais; e ainda a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Além disso, consagramos como princípio que rege as relações internacionais a prevalência dos direitos humanos.

Tais dispositivos constitucionais dão margem para uma grande reflexão que devemos ter acerca da conduta do Estado para com o indivíduo. Os direitos humanos são essenciais ao desenvolvimento da sociedade, tendo em vista que garante minimamente os direitos civis, sociais e políticos. Tais garantias são de suma importância quando nos deparamos com a história do mundo, com episódios de torturas, escravidão, racismo, privação da liberdade de expressão.

Temáticas densas que refletem no agir entre civis e entre civis e Estado, que fazem-nos discutir principalmente acerca da criminalização da pobreza versus a manutenção de uma ordem.

Acontecimento(s) que não deveria se quer existir como exceção, e que na triste realidade passamos a enxergar como uma prática comum e abusiva.

A Constituição estabelece a dignidade da pessoa humana e garante uma promoção dos direitos e garantia fundamentais, pontos que na maioria das vezes podemos afirmar que são trechos que não produzem efeitos. O próprio Estado agiu de forma abusiva, autoritária, desrespeitando o direito do indivíduo – independentemente de sua conduta -, não preservando a dignidade da pessoa humana. Comparar a prática das ações com sujeitos distintos faz nos enxergar um padrão de práticas abusivas, que ferem drasticamente os direitos humanos. Refletir é preciso, fortalecer os direitos “comemorados” no dia de hoje é necessário ao desenvolvimento da humanidade. Aconteceria tal fato com um indivíduo que fosse branco, pertencesse a uma classe média alta e estivesse em fuga portando drogas? Seria ele puxado por uma moto pilotada por um policial?

*Hortênsia Nunes Braz de Oliveira (hnunesboliveira@gmail.com) é advogada, Pós-Graduada em Direito Processual Civil, Direito Tributário e Direito Público.

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