GOVERNO VACILÃO CANTOU VITÓRIA ANTES DO FINAL DO JOGO

Bernardo Mello Franco – O Globo

O governo dormiu em festa e acordou em pânico. Na noite de quinta, o Planalto cantou vitória e anunciou que os caminhões voltariam a circular. Na manhã de sexta, foi atropelado pelos fatos. As rodovias continuaram bloqueadas, e a crise de abastecimento se agravou em todo o país.

O Planalto errou ao ignorar os alertas de revolta contra a disparada do preço do diesel. Errou de novo ao negociar com gente que não tinha força para suspender o motim. Errou mais uma vez ao abrir o cofre antes de garantir a liberação das estradas.

Com o acordo na lona, Michel Temer apelou à saída de sempre: pediu socorro às Forças Armadas. Os militares não conseguem reduzir a violência no Rio, e agora se veem atirados em outra fogueira. Ao receber a nova missão, avisaram ao chefe que também correm o risco de ficar sem combustível.

O presidente resolveu endurecer o discurso. Em tom enfezado, disse que “terá a coragem de exercer sua autoridade”. Qual autoridade? O poder presidencial parece cada vez menor, esvaziado pela rejeição popular e pela debandada de aliados.

Temer está entrincheirado no palácio, cercado de bajuladores e políticos sem voto. O ministro Moreira Franco, novo titular de Minas e Energia, desapareceu no auge da crise. Agora quem fala pelo presidente é Carlos Marun, ex-capataz de Eduardo Cunha.

O ministro-pitbull voltou a dar plantão na TV para defender o chefe. “Fomos exitosos”, assegurou à GloboNews, na tarde em que o noticiário mostrava o fiasco do acordo. Na mesma entrevista, ele disse integrar o “melhor governo da história do país por hora de mandato”.

Marun não é o único desconectado da realidade. O Planalto acaba de lançar uma campanha publicitária para comemorar os dois anos do impeachment que instalou Temer no poder. Enquanto a propaganda repete o bordão “Avançamos”, a população experimenta a escassez de combustível, transporte e alimentos.

Na quarta-feira, terceiro dia de bloqueio nas estradas, o site do MDB afirmou que “os tempos de instabilidade, recessão e desequilíbrio econômico ficaram para trás”.

Elio Gaspari – Folha de S.Paulo

De uma hora para outra, houve uma greve de caminhoneiros, e o presidente da Petrobras, Pedro Parente, tornou-se o responsável por dias de caos. Duas falsidades.

O que houve não foi uma greve de caminhoneiros, mas uma doce parceria com os empresários do setor de transporte de cargas rodoviárias. Diante dele, o governo capitulou. A repórter Miriam Leitão mostrou que só 30% dos caminhões pertencem a motoristas autônomos.

Na outra ponta estão pequenas empresas subcontratadas e grandes transportadoras. Uma “greve de caminhoneiros” pressupõe greve de motoristas de caminhão. Isso nada tem a ver com estradas obstruídas.

Pedro Parente não provocou o caos. Desde sua posse na presidência da Petrobras ele descontaminou-a do caos que recebeu. Na base dessa façanha esteve uma nova política de preços acoplada ao valor do barril no mercado internacional. É assim que as coisas funcionam em muitos países do mundo. Se o preço do diesel salgou a operação do setor de transporte de cargas o problema é dele, não de uma população que foi afetada pelo desabastecimento e agora pagará a conta. Os empresários sabiam muito bem o tamanho da confusão que provocariam.

O sujeito oculto da produção do caos foi o governo de Michel Temer. No seu modelito Davos, orgulhou-se da política racional de preços dos combustíveis. Já no modelito MDB-DEM-PP-PR-PPS, fez de conta que ela não teria custo político.

Deveria ter provisionado um colchão financeiro para subsidiar a Petrobras, mas essa ideia era repelida pelos sábios da ekipekonômica. Diante do caos, descobriram que o colchão era necessário.

O governo tolerou a bagunça e associou-se ao atraso. A primeira reação de Temer deveria ter sido a responsabilização dos empresários, desmistificando a ideia de “greve dos caminhoneiros”. Bloqueou estrada? Reboco o caminhão, caso ele não pertença ao motorista. Queimou o talonário do policial que multou o veículo? Prendo-o. Só mudou o tom e exerceu a autoridade na sexta-feira, usando a força federal para desobstruir estradas.

Desde o primeiro momento tratou-se do caso com o gogó, deixando que o problema deslizasse para a Petrobras e seu presidente. Conseguiram piorar a discussão, beneficiando grupos de pressão, com o dinheiro dos outros.