GIGANTISMO, LUXO E EXCLUSÃO

* Alexandre Borges

Nuvens cinzas cobriam todo o céu de Salvador quando o grupo de catorze estudantes de jornalismo da Universidade do Estado da Bahia, campus de Juazeiro, chegou às imediações da Arena Fonte Nova na tarde fria de 18 de junho de 2013. Via-se, estampado nos olhos o fantasma de uma expectativa que há muito ansiava por ser suprida. Ali, do lado de fora, trabalhadores seguiam firmes em seu exercício diário, com o objetivo de que no dia do início dos jogos tudo estivesse nos conformes. O sorriso no rosto do guia que surge parece tão genuíno quanto a empolgação anteriormente descrita.

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Arena Fonte Nova, em Salvador. Foto: Adeilton Jr.

A maquete do grande gigante já cumpre a missão de causar impacto ao simples entrar. Alguns ainda parecem perdidos, entre fotos de si, fotos do local e fotos do verde e amarelo crachá, elemento responsável por dar passe livre (ao menos por algumas horas) ao eufórico grupo. Ao início das explicações, as palavras de Ricardo Said, o “guia”, não soam tão interessantes quanto o cenário em si, mas uma parte registra, nos blocos ou nas folhas surradas, parte de suas palavras. Entre antenas de internet 4G, esquemas sobre Raio X ou locais de entrada e um pequeno susto de alguns ao pensar que a visita chegava ao fim, antes mesmo de seu início, a Arena Fonte Nova foi desbravada.

Os 55 mil lugares construídos para abarcar os telespectadores dos jogos entre Uruguai e Nigéria, Brasil e Itália e a grande final encantam ao mesmo tempo em que trazem a nostalgia do início de tudo, quando a possibilidade de se sentar em uma daquelas cadeiras ou de simplesmente estar presente em qualquer um daqueles cenários em dia de jogo não parecia uma utopia dolorida. Permanece, contudo, a máxima de que o hoje não deve deixar de ser vivido em detrimento do que ainda vai acontecer. E, assim, os flashs continuam a disparar, assumindo ares mais eufóricos e extasiantes à medida que os ambientes são desbravados.

Sala de imprensa, vestiário, área de logística, setor de voluntários… Nada escapa aos olhos atentos e as bocas não caladas. Nem mesmo o lado “B” da questão. Do outro lado da arena, há aqueles cuja inquietação norteia-se de maneira diferente. A estes, os ares babilônicos mais incomodam do que qualquer outra coisa. Sentem que seu direito de ir e vir, primordial e garantido pela constituição, pode ser suprimido nos dias de jogo. Estimam a grande quantidade de dinheiro ali investida. E há ainda aqueles que o fazem de maneira exata e afirmam, estufando o peito e despidos da euforia geral pela Copa: “Poderiam ser feitas X escolas, Y hospitais ou Z investimentos em melhorias básicas de saúde.”

Nas ruas, os protestos dos últimos dias ditam, então, que não são casos específicos restritos as localidades da Arena. É uma inquietação urbana, quase que geral, que se vê representada em um grande grupo que insatisfeito com os rumos tomados pelo país. Burburinhos inquietantes revelam uma visão maior, um caos no meio da luz e uma genuína e sincera preocupação (misturada num caldeirão de revolta) a respeito dos rumos dos próximos dias. “Que país é esse?”, gritam.

Superados, enfim, os cinzentos degraus que levam ao gramado, alguns gritos contidos saem de lábios mais afoitos e os brilhantes estandartes de Brasil, Itália, Nigéria e Uruguai balançam à leve ventania e já deixam claro que o Gigante está acordado e pronto para receber a prévia do maior espetáculo do mundo.

Vencidas as últimas etapas, do retorno ao transporte com uma energia renovada e imagens e conhecimentos eternizados na memória, ecoam, nos ouvidos deste que aqui vos escreve, os versos que um dia um cantor de pop rock imortalizou com sua áspera voz:

“Que coisa linda é uma partida de futebol.”

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