O suboficial da reserva Marco Antônio Braga Caldas, 51, é alvo de um Conselho de Disciplina com término previsto para maio. O processo foi aberto após o STF (Supremo Tribunal Federal) condená-lo a 14 anos de prisão sob acusação de praticar crimes contra a democracia.
A possível expulsão deve abrir uma sequência de decisões negativas para militares relacionadas aos ataques de 8 de janeiro ou à trama golpista de 2022.
A Marinha e o Exército são as duas Forças que tiveram ex-comandantes denunciados pela PGR (Procuradoria-Geral da República).
O almirante Almir Garnier Santos, ex-chefe da Força Naval, tornou-se réu no fim de março sob acusação de dar apoio militar aos planos golpistas apresentados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Um processo contra ele na Marinha só deve ser aberto se o ex-comandante for condenado pelo STF.
CONSELHO DE DISCIPLINA
O Conselho de Disciplina é instaurado para julgar militares suspeitos de terem cometido infrações disciplinares ou que tenham sido condenados a penas de mais de dois anos pela Justiça comum.
No caso de Caldas, o colegiado deve decidir se ele é incapaz de permanecer vinculado à Marinha após sua condenação no Supremo.
O processo pode durar até 50 dias. Em situações como a do suboficial, em que se analisa uma condenação em tribunal civil, a decisão final pode ser levada ao comandante da Marinha após recomendação dos membros do conselho.
Dois almirantes ouvidos pela reportagem disseram que o processo deve resultar na exclusão do suboficial dos quadros da Marinha. Caso o cenário se concretize, a aposentadoria de Caldas passará à sua família.
O suboficial deve ainda perder o direito de permanecer preso em unidade militar -ele cumpre pena na Escola de Aprendiz de Marinheiros, em Florianópolis, desde junho de 2024. A Marinha tenta transferi-lo para uma unidade no Rio de Janeiro, considerada mais apropriada para a reclusão de militares condenados pela Justiça.
O advogado Douglas Eduardo disse, em nota, que o processo na Força não se mistura com a condenação no STF.
“A análise do conselho não está vinculada aos fatos apurados no processo criminal, tampouco a seu resultado, mas considera o contexto geral da conduta do militar, levando em conta sua condição de militar da reserva remunerada e o direito à liberdade de expressão garantido por lei”, afirmou.
Ele defende que a participação de Caldas foi pacífica e não configura infração disciplinar. Douglas elogiou ainda o Conselho de Disciplina, dizendo que ele atuou com “brilhantismo” e “observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa”.
“Conforme restou comprovado nos autos do Conselho de Disciplina, o acusado, suboficial Caldas, absolutamente não infringiu qualquer regra ética mínima e/ou feriu o decoro militar tipificado no Estatuto dos Militares, capaz de legitimar sua expulsão da Marinha do Brasil, eis que sua mera presença naquele dia e local não tem o condão de caracterizar a inobservância de qualquer preceito militar a ele aplicado”, completa.
Marco Antônio Braga Caldas era mergulhador da Marinha. Ele deixou a ativa em 2021, após cerca de 30 anos de serviço, e passou a viver em Balneário Piçarras (SC).
Chegou a Brasília na manhã de 8 de janeiro de 2023 em uma excursão gratuita e diz não saber quem financiou a viagem. Sua intenção, afirma, era protestar contra a eleição do presidente Lula (PT) pelo fato de o petista já ter sido condenado na Justiça por corrupção.
A denúncia da PGR afirma que Caldas seguiu do Quartel-General do Exército até a Esplanada dos Ministérios em uma caminhada com centenas de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Ele foi preso dentro do Palácio do Planalto. Seu celular, apreendido pela Polícia Federal, mostra fotos e vídeos de Caldas no térreo e no segundo andar da sede do Executivo.
Em audiência no Supremo, ele negou que tenha participado da quebradeira. Diz que defendeu um policial militar que era linchado por manifestantes e procurou refúgio no Palácio do Planalto.
O suboficial ficou preso de janeiro a agosto de 2023, já denunciado pela PGR. O ministro Alexandre de Moraes, do STF, autorizou sua soltura por considerar que todas as provas haviam sido colhidas, e que a liberdade de Caldas não era mais um risco para as investigações.
Antes do julgamento, o militar enviou uma carta aos ministros da corte citando suas décadas de serviço na Marinha para defender sua inocência.
Disse ser um “ardente defensor do Estado democrático de Direito” e que sua intenção era participar de uma “manifestação pública pacífica, o que se provou não ser o caso”.
“Gostaria de enfatizar a Vossas Excelências que sou um cidadão brasileiro, cristão e casado, que espera ser julgado com base na crença de estar participando de uma manifestação pública e pacífica, e não pelos atos cometidos por uma parte que resultaram em danos ao patrimônio público.”