A saga do Petrolinense Ottomar Pinto. Saiba quem foi

Por Lerin Macedo*  

Gostaria de compartilhar com vocês a história de um homem que, assim como Graciliano Ramos retratou em “Vidas Secas”, nasceu em uma época de grandes transformações sociais e tristeza no Nordeste.

Refiro-me a Ottomar de Sousa Pinto, nascido em 19 de janeiro de 1931 em Petrolina. Ele começou a trabalhar cedo para ajudar no sustento da família, vendendo balas de coco e lendo cartas para pescadores e barqueiros analfabetos. Faleceu em 11 de dezembro de 2007, em Brasília, devido a uma parada cardíaca.

Ele deixou quatro filhos do primeiro casamento: Ottomar Filho, Marília, Marisa e Otília, além de Laura, filha do segundo casamento com a senadora Marluce Pinto.

Ele era filho de Félix Pinto, um pedreiro que se tornou mestre de obras e foi responsável pelo calçamento e meio-fio das ruas da cidade. Félix deixou sua marca em Petrolina, sendo homenageado com uma rua em reconhecimento ao seu trabalho.

No início da minha carreira profissional no serviço público, eu tive o privilégio de trabalhar na Secretaria Municipal de Educação de Petrolina e conhecer diversas histórias inspiradas sobre Ottomar. Essas histórias foram contadas por sua prima, amiga, mentora e confidente, Maria Terezinha Soares (Ninon).

Ottomar estudou no Colégio Diocesano Dom Bosco, onde só os alunos da classe alta tinham acesso. Conseguiu entrar e estudar com bolsa de estudos. Mesmo com dificuldades financeiras, não desistiu. Calçava um pé de sapato e o outro de sandália para ir à escola, com a desculpa de que um de seus pés estava doente e quando se desgastava ele usava o outro, invertendo-os, pois não tinha dinheiro para comprar um par novo.

Aos 17 anos de idade, deixou sua querida Petrolina, num pau de arara, rumo ao Rio de Janeiro, onde iniciou sua carreira militar na Força Aérea Brasileira em 1948, uma forma de sobreviver. Enfrentou muitos desafios e superou dificuldades, chegando ao posto de Coronel em 1973 e, anos depois, ao posto de Brigadeiro graças a sua dedicação e trabalho duro.

Em uma época marcada por grandes desafios sociais no Nordeste, a região enfrentou a seca, a fome e a miséria, o que se impactou a rotina de uma legião de conterrâneos. Apesar das adversidades, Ottomar demonstrou ser valente e perseverante, características típicas dos nordestinos, conforme retratado por Euclides da Cunha. Ele superou obstáculos em uma caminhada de pedra sobre pedra, vencendo desafios e alcançando grandes conquistas ao longo de sua vida.

A saga de Ottomar é um exemplo de resiliência que lembra Graciliano Ramos e seu livro “Vidas Secas”, ao retratar a luta dos retirantes nordestinos para sobreviver em meio à seca e à fome. Assim como Fabiano, personagem do livro, a profissão militar era vista como uma oportunidade de ascensão social para jovens pobres do Nordeste.

Sua trajetória foi marcada por tornar-se um líder militar influente, alcançando o posto de Brigadeiro, e posteriormente se tornar um grande líder político que lutava por seus ideais.

Ele se formou em Medicina, Engenharia Civil, Engenharia Elétrica, Economia e Direito, concluindo ainda pós-graduação, mestrado e doutorado. Isso é a prova mais incontestável que, com dedicação e perseverança, podemos alcançar a vitória, independentemente de nossas origens ou condições.

Ottomar passou por diversos cargos públicos, inclusive na COMARA — Comissão de Aeroportos da Região Amazônica, onde contribuiu significativamente por sete anos para o desenvolvimento da região Norte. Ele recebeu a alcunha de “Construtor do Ar”. Sua primeira tarefa neste cargo foi reformar e expandir o Aeroporto de Boa Vista em 1972.

Além disso, a Ottomar realizou diversas obras aeroportuárias. Como a construção de uma pista de pouso, um terminal de passageiros, um terminal de carga e de um sistema de drenagem nos aeroportos de Santarém (PA) e de Petrolina (PE), cidade em que nasceu.

Em 1979, o Presidente da República o nomeou Governador do Território Federal de Roraima, dando início à sua bem sucedida trajetória política. Com o tempo, sua liderança tornou-se conhecida. Exerceu o cargo de Deputado Federal em 1987, participando da Assembleia Nacional Constituinte que elevou o então Território à condição de Estado. No pleito de 1990, Ottomar Pinto foi o primeiro eleito pelo voto direto para governar Roraima. Elegeu-se Prefeito de Boa Vista em 1996, deixando sua marca na cidade. Disputou e perdeu a eleição em 2002 ao governo do Estado, mas em 10 de novembro de 2004, assumiu novamente o cargo após a decisão do Tribunal Superior Eleitoral que cassou o mandato de Flamarion Portela por crime eleitoral. Ottomar Pinto se reelegeu governador em 2006.

A trajetória de dele é um exemplo de perseverança e superação, que serve de inspiração para todos aqueles que enfrentam dificuldades em busca de seus sonhos e jamais desistir. Na obra “Só não falei das flores”, escrito por Gilberto Maciel Santos, um juazeirense que conviveu com Ottomar em Roraima, detalha o legado dele. Um relato enriquecedor da sua história de luta, mostrando como é possível alcançar o sucesso, independentemente das adversidades enfrentadas.

Ottomar amava Petrolina com paixão e entusiasmo. Ele perguntava sempre pelos conterrâneos Pe. Bernardino e por Celestino Gomes (pintor, escultor e escritor). Frequentemente trazia empresários e fazendeiros de Roraima para mostrar o potencial de sua cidade natal.

Quando se encontrava com seus conterrâneos, Ottomar costumava estender a conversa falando sobre seu tempo de infância, as famílias tradicionais, seu pai Felix Pinto e outros casos vividos às margens do rio São Francisco. Muitas vezes, na solidão de seus cargos públicos, Ottomar meditava em voz alta, dizendo: “Sabe o que eu queria agora? Queria estar em Petrolina, às margens do São Francisco para ver as águas correrem”. E complementava, ainda mais melancolicamente: “Deixei Petrolina muito cedo, mas Petrolina nunca me deixou”. Nenhum dos presentes ousava quebrar o silêncio. Todos sabiam que esse momento deveria ser respeitado, em nome do coração choroso e da saudade de sua terra.

*Historiador em Brasília

Originalmento publicado no Blog do Magno

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *