Bolsonaro incorreu em crime eleitoral ao fazer comício no Planalto com 280 bispos evangélicos, 90 deputados e 8 senadores

Com o esmero de quem sabia exatamente quais objetivos precisava atingir ao atrair 280 bispos de diversas denominações evangélicas – Igreja Universal, Assembleia de Deus Ministério Madureira, Assembleia de Deus Vitória em Cristo, Sara Nossa Terra e Evangelho da Graça, entre outros. Era necessário fazer com que aquela plateia de difusores (ou, por outra, “cabos eleitorais qualificados”) difundisse ao máximo o discurso de Jair Bolsonaro e as palavras carregadas de referências bíblicas à “missão” divina que ele teria “sobre a Terra”: vencer “o outro lado”, ou “aqueles lá”, ou “o diabo do passado”, como o ex-presidente Lula e o PT foram tratados nos discursos, sempre na condição de sujeitos ocultos nas frases ferinamente envenenadas.

Entre os eleitores que se dizem evangélicos, Lula e Bolsonaro estão tecnicamente empatados em intenções de voto. Dependendo da empresa de pesquisa, ambos oscilam entre 30% e 34% na preferência do subgrupo. Ferrenhamente apoiado pelos evangélicos em razão da “pauta de costumes” e de retrocessos sociais com a qual se elegeu em 2018, Bolsonaro esperava abrir larga diferença neste corte das pesquisas e compensar a fragorosa derrota que colhe no eleitorado feminino. Construir um evento de início de campanha para sedimentar-se como opção única do eleitorado evangélico (em 2022, cerca de 40% dos eleitores brasileiros) era o alvo da cerimônia ocorrida em prédio público, o Palácio do Planalto, organizada por servidores públicos, o Cerimonial da Presidência, e tendo como plateia de “pipoca” 90 deputados federais da base governista e mais oito senadores.

Em apertada síntese, como dizem os advogados, estava tudo irregular no evento de campanha bolsonarista no Planalto. Mesmo que a campanha eleitoral não tenha sido iniciada, partidos políticos adversários do PL de Bolsonaro na disputa em que ele tentará ser reeleito podem entrar com pedido de investigação e punição. Entre os ministros do Supremo Tribunal Federal há ao menos dois deles que consideraram o ato um acinte, um abuso e um desafio às regras de isonomia do trato eleitoral. A punição para Jair Bolsonaro e o PL podem ir desde advertência a multa de R$ 50.000,00 e, até, a uma improvável rejeição do registro da candidatura por cometimento de crime eleitoral. Improvável, contudo passível de análise..

O que disseram os bispos em suas falas de apoio e como o ato vai ser distribuído nas igrejas

Em sua fala, o bispo Abner Ferreira, líder da Assembleia de Deus Ministério Madureira, a maior e mais tradicional das denominações neopentecostais, disse que “há um chamamento em 2022, ano de eleição presidencial” e ainda acentuou: “estamos aqui por isso, e não podemos perder isso de vista”. O ex-presidente Lula tem ótimo relacionamento com o bispo Manoel Ferreira, pai de Abner, com que se encontrou no início deste ano. Há, entretanto, uma divisão de poder na família.

Referindo-se explicitamente ao PT e aos governos Lula e Dilma Rousseff, o bispo Silas Malafaia, da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, fez um discurso claramente político e depreciativo a adversários de Bolsonaro (aliás, outra conduta vedada para cerimônias públicas em prédios oficiais segundo a legislação eleitoral). “Essa gente que quer governar o país? Deus nos livre disso. Estou mostrando aqui o império da safadeza e da roubalheira, da cultura da corrupção, que se instalou nesse país esses anos todos”, imprecou Malafaia, ele mesmo investigado por corrupção em diversos processos que envolveram o governo do estado do Rio de Janeiro na gestão de Wilson Witzel, que terminou cassado.

Se restar alguma dúvida quanto aos objetivos político-eleitorais do ato ocorrido nas dependências do Planalto, organizado por funcionários públicos e tendo por finalidade maior a cabala de votos para Jair Bolsonaro, investigue-se, então, o por que de todos os bispos convidados terem deixado seus endereços eletrônicos com funcionários destacados para a missão: links com versões integrais e editadas do evento, em alta resolução, foram passadas aos animadores evangélicos com o propósito de difundi-los em todos os templos de cada uma das denominações ali presentes.

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