DP – Evocando o princípio de que toda pessoa tem o direito humano e fundamental de ser investigada por uma autoridade competente, o Ministério Público Federal (MPF) recomendou à Secretaria de Estado da Segurança Pública de Alagoas (SSP/AL) a suspensão da operacionalização de interceptações telefônicas, que considera ilegal por ser conduzida por órgãos estranhos à estrutura da Polícia Judiciária e do Ministério Público.A recomendação, ignorada até hoje, foi feita no dia 28 de agosto, pela procuradora da República Niedja Káspary. Mas a pasta da Segurança Pública do governo de Renan Filho (PMDB) nega haver ilegalidades no fato de manter uma central de monitoramento em sala anexa ao gabinete do secretário da SSP, o coronel PM Lima Júnior, exclusivamente operada por policiais militares.
Káspary pede a transferência da central de monitoramento das interceptações para a sede da Polícia Judiciária. E defende que a manipulação de dados sigilosos captados em interceptação telefônica por pessoas estranhas aos quadros de pessoal da Polícia Civil, do Ministério Público e do Poder Judiciário encontra-se em contradição a todos os preceitos normativos citados na referida recomendação, além de representar ingerência indevida da Assessoria Integrada de Inteligência da SSP sobre a atividade desenvolvida pela Polícia Judiciária Alagoana.
“Incumbe à Assessoria Integrada de Inteligência [da SSP] assessorar o Secretário em tema de gestão estratégica, sendo, portanto, órgão externo à persecução criminal, não detendo atribuição para a abertura de inquérito policial e o desenvolvimento de investigações visando à repressão de crimes. […] A permanência dessa prática por mais de dez anos também não é apta a legalizar a atuação da Assessoria Integrada de Inteligência, tendo em vista a impossibilidade de se convalidar atos dessa estirpe pelo decurso do tempo, porquanto contrários à ordem jurídica”, dizem alguns trechos da recomendação, que faz referência a contrarrazões da SSP.
Além de citar a violação dos direitos humanos e tratados internacionais, o MPF argumenta que a Constituição Federal, a Constituição do Estado de Alagoas, a Lei Federal nº 9.296/96 e as Resoluções nº 59/2008 e 36/2009 do CNJ e do CNMP não respaldam a participação de outro órgão do Poder Executivo distinto da Polícia Civil no manuseio de conversas telefônicas decorrentes de uma investigação criminal, salvo quando expressamente autorizado pelo Poder Judiciário em determinado caso concreto.
Veja um trecho da recomendação:
MP Estadual apoia SSP
Apesar da extensa alegação de que é ilegal o acesso ao monitoramento das interceptações operadas por integrantes da SSP e da Polícia Militar de Alagoas, o Ministério Público Estadual de Alagoas discorda do MPF e defende a manutenção da operação do sistema nos moldes atuais.
O chefe do MP, Alfredo Gaspar de Mendonça, que foi secretário da SSP no início do governo de Renan Filho, falou em levar o caso ao STF, se for necessário. E lembra que a própria Polícia Federal em Alagoas já usou homens da PM para interceptações telefônicas, em parceria duradoura.“Nunca teve problema. Eles apenas ouvem e transcrevem. Trabalhamos com parcerias, tudo sob a fiscalização do MP. Quem requer as interceptações e fiscaliza é o MP. Tudo dentro da legalidade, o entendimento do MP, por meio do Procuradoria Geral de Justiça, é diferente. Integração e a palavra-chave. Se for preciso, vamos até o STF. Qualquer interceptação passa pelo crivo do Judiciário”, defendeu o chefe do MP e ex-secretário, citando extensa jurisprudência no STF favorável à prática.
A Assessoria Integrada de Inteligência, nos moldes em que funciona hoje, foi criada no governo de Teotonio Vilela Filho, quando era coordenada pelo então secretário-adjunto da Secretaria de Defesa Social, o delegado da Polícia Civil José Édson, e pelo delegado Rodrigo Sarmento, antes de o coronel PM Dário Cesar assumir a pasta e lotar policiais militares para a função.
A SSP não respondeu aos questionamentos do Diário do Poder, enviados para sua assessoria de imprensa.

